Recentemente a PEC 03/2022 ganhou grande repercussão nas redes de internet, através de comentários de celebridades, entretanto a citada Proposta de Emenda à Constituição é de 2011 e foi remetida ao Senado em 2022.
A discussão se deu em torno da interpretação de que com a aprovação da emenda haveria a autorização da privatização das praias, tornando-as bens de uso particular.
Contudo, a PEC trata de assunto referente aos terrenos de marinha e seus acrescidos, definidos como bens da união, conforme artigo 20, inciso VII da Constituição Federal.
Os terrenos de marinha são aquelas faixas imediatamente após as praias, uma faixa fictícia, deliminada entre a linha preamar e o continente, o Decreto-Lei nº 9.760/1946 em seu artigo 2º estabelece que: “são terrenos de marinha, em uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha do preamar-médio de 1831” situados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés ou os que contornam as ilhas situadas em zona onde se faça sentir a influência das marés.
Na época, que remonta a década de 40, os terrenos de Marinha foram criados com o intuito de defesa nacional, levando em consideração a importância de resguardar o litoral.
Atualmente tais terrenos possuem função majoritariamente patrimonial para a União, sendo fonte de receita que permite a utilização do imóvel por particular, seja em regime de aforamento ou ocupação.
Já as praias, não podem ser objeto de ocupação, nem tampouco privatização, tendo em vista que são bens de uso comum do povo.
Entende-se como bens de uso comum do povo aqueles bens acessíveis a todos e destinados ao uso geral da população, como rios, mares, estradas, ruas e praças.
Importante destacar que esses bens são inalienáveis e imprescritíveis, conforme estabelece o art. 20, caput, da Constituição Federal, e o art. 99, I, do Código Civil de 2002.
Conforme preceitua a lei 7.661/88, em seu art.10, § 3” As praias são bens públicos de uso comum do povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco acesso a elas e ao mar, em qualquer direção e sentido, ressalvados os trechos considerados de interesse de segurança nacional ou incluídos em áreas protegidas por legislação específica.”
Portanto, fica claro que a PEC 03/2022 não diz respeito a privatização das praias, sendo estas e os terremos de marinha bens públicos de naturezas distintas.
Superada então a presente polêmica, do que se trata a PEC 03/2022?
De forma sucinta a Proposta de Emenda, tem como objetivo extinguir o instituto do terreno de marinha e seus acrescidos, mais especificamente o inciso VII do Artigo 20, além do parágrafo terceiro do Artigo 49 das Disposições Constitucionais Transitórias.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC), em sua redação atual, estipula que, se aprovada, as áreas designadas como terrenos de marinha e seus acréscimos terão sua propriedade definida da seguinte maneira: As áreas utilizadas para o serviço público federal permanecerão sob o controle da União, o que inclui aquelas destinadas à utilização por concessionárias e permissionárias de serviços públicos, unidades ambientais federais e áreas desocupadas.
Além disso, a PEC também transfere a propriedade plena dos terrenos de marinha e seus acréscimos para os Estados e municípios das áreas utilizadas para o serviço público estadual e municipal. Destaco que atualmente, a União já celebra diversos tipos de contratos com esses entes públicos para a destinação desses imóveis.
Em relação aos imóveis em terrenos de marinha e seus acréscimos ocupados por cessionários, foreiros e ocupantes devidamente inscritos Secretaria do Patrimônio da União (SPU), o domínio pleno será transferido para esses ocupantes até a data da publicação da Emenda Constitucional.
Ressalto que hoje já existem outros instrumentos para remição do foro e consolidação do domínio, bem como a aquisição de imóveis da União, além de todas as disposições relativas à preservação ambiental e legislação urbanística que devem ser respeitadas.
Esclarecida então a diferença entre praias e terrenos de marinha, assim como discutido um pouco do que se trata a PEC em questão, importante relembrar que se trata apenas de uma Proposta de Emenda à Constituição, logo tramita ainda no âmbito legislativo, necessário aguardarmos as” cenas dos próximos capítulos”.