Alguma vez você já se perguntou se o herdeiro possui legitimidade para entrar com a Ação de Usucapião?
Pois bem, recentemente chegou ao STJ caso de um herdeiro que exercia a posse exclusiva do imóvel e ajuizou Ação de Usucapião. No caso em questão o pai do herdeiro faleceu deixando outros filhos, foi aberto o inventário, contudo, devido a entraves não teve andamentos significativos, se arrastando por anos.
O herdeiro em questão morava sozinho no imóvel, seus outros irmãos não residiam no local e nunca demonstraram interesse pelo imóvel, decorridos 15(quinze) anos, o herdeiro que reside na casa ingressou com a Ação de Usucapião Extraordinária, pleiteando que fosse declarado proprietário do imóvel.
Para fins informativos a Usucapião Extraordinária, prevista no art. 1.238 do Código Civil, possui, em regra, como requisito, a posse por 15 anos, podendo ser diminuída para 10 anos caso o possuidor more no imóvel ou realize obras de caráter produtivo, além de não exigir a prova de justo título e boa fé.
Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.
Sendo assim se observa que em um panorama geral o herdeiro possuía os requisitos para o ajuizamento da Usucapião Extraordinária, podendo haver óbice na questão deste ser herdeiro, além de possuir outros herdeiros, bem como da existência de Inventário aberto.
O juiz de primeiro grau ao julgar o caso extinguiu o processo sem resolução do mérito sob a fundamentação de que o herdeiro não teria legitimidade para propor ação de usucapião. Para o juízo a quo o imóvel já pertence ao Autor, bem como aos irmãos em condomínio, e o fato de apenas um dos herdeiros residir no imóvel seria mera liberalidade, vejamos trecho da argumentação do magistrado:
“Inexiste interesse de agir, uma vez que o autor não pode usucapir um imóvel que já lhe pertence. In casu, tanto o autor, quanto os herdeiros do espólio requerido, possuem o direito de domínio sobre o imóvel.A existência de condomínio na posse, ainda que o herdeiro permanecesse no imóvel por mais de quinze anos após o falecimento do genitor, não caracteriza a posse ad usucapionem, pois durante todo esse período não exerceu a posse de forma inequívoca e inconteste, pois todos os herdeiros, inclusive o autor, sabiam da necessidade de regularização do imóvel.A ocupação do imóvel pelo autor se traduz em atos de mera tolerância, o que não induz a posse necessária à usucapião. Tem-se que a posse exercida por ele deriva de mera liberalidade, sendo, por isso, imprestável para usucapião.”
Insatisfeito o Autor da ação recorreu ao Tribunal que manteve a posição do juízo a quo, interpôs Recurso Especial e a demanda chegou ao Superior Tribunal de Justiça, que entendeu pela possibilidade da usucapião de imóvel herdado por um herdeiro que tenha posse exclusiva.
O Relator do processo (AgInt no AREsp 2.355.307-SP) Ministro Raul Araújo ressaltou que jurisprudência da Corte já havia firmado entendimento no sentido de que há possibilidade da usucapião de imóvel objeto de herança pelo herdeiro que tem sua posse exclusiva, ou seja, há legitimidade e interesse de o condômino usucapir em nome próprio, desde que exerça a posse por si mesmo, ou seja, desde que comprovados os requisitos legais atinentes à usucapião extraordinária.
Ocasião em que citou voto da Min. Nancy Andrighi em caso semelhante (REsp n. 1.631.859/SP):
A partir da transmissão da herança com a abertura da sucessão, “cria-se um condomínio pro indiviso sobre o acervo hereditário, regendo-se o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, pelas normas relativas ao condomínio”. Assim, “O condômino, tem legitimidade para usucapir em nome próprio, desde que exerça a posse por si mesmo, ou seja, desde que comprovados os requisitos legais atinentes à usucapião, bem como tenha sido exercida posse exclusiva com efetivo animus domini pelo prazo determinado em lei, sem qualquer oposição dos demais proprietários” (STJ. 3ª Turma. REsp 1.631.859/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 22/5/2018).
Sendo assim, conclui-se que o herdeiro possui legitimidade e interesse em usucapir em seu nome, devendo, entretanto, exercer a posse de forma exclusiva, além de cumprir os requisitos legais para a usucapião extraordinária.