Quem lida com conflitos familiares certamente já se deparou com um fenômeno que não é novo, mas que vem sendo identificado por mais de um nome: síndrome de alienação parental – SAP, alienação parental ou implantação de falsas memórias.
Em verdade, culturalmente sempre existiu a tentativa de um dos pais desqualificar o outro, no entanto, só recentemente o tema começou a despertar a atenção do judiciário, diante dos reflexos na vida social de uma criança.
Antigamente os papéis parentais eram segregados: o pai era o provedor e a mãe a cuidadora. Assim, quando da separação os filhos ficavam sob a guarda materna e ao pai cabia o encargo de pagar alimentos e visitá-los quinzenalmente, se tanto.
Porém, com evolução feminina ao longo do tempo, as mulheres passaram exercer atividades fora do lar, e os homens descobriram as delícias da paternidade e começaram a ser muito mais participativos no cotidiano dos filhos.
Assim, quando da separação, eles não mais se conformam com o rígido esquema de visitação, muitas vezes boicotado pelas mães, que se sentem “donas” dos filhos, exercendo sobre eles um poder absoluto.
É comum, quando da ruptura da vida conjugal, se um dos cônjuges não consegue elaborar adequadamente o luto da separação, com o sentimento de rejeição, ou com raiva pela traição, surge o desejo de vingança que desencadeia um processo de destruição, de desmoralização, de descrédito do ex-parceiro. Sentir-se vencido, rejeitado, preterido, desqualificado como objeto de amor, pode fazer emergir impulsos destrutivos que ensejam desejo de vingança, dinâmica que faz com que muitos pais se utilizem de seus filhos para uma vingança moral.
Foto reprodução: Jorge Veiga
Dessa forma, entre relações falseadas, sobrecarregadas de imagens parentais distorcidas e memórias inventadas, a alienação parental vai se desenhando: pais riscam, rabiscam e apagam a imagem do outro genitor na mente da criança.
Um dos genitores leva a efeito verdadeira “lavagem cerebral”, de modo a comprometer a imagem que o filho tem do outro, narrando maliciosamente fatos que não ocorreram ou não aconteceram conforme descrito pelo alienador.
Ao abusar do poder parental, o genitor busca persuadir os filhos a acreditar em suas crenças e opiniões. Ao conseguir impressioná-los, eles sentem-se amedrontados na presença do outro. Ao não verem mais o genitor, sem compreenderem a razão do seu afastamento, os filhos sentem-se traídos e rejeitados, não querendo mais vê-lo.
Como consequência, sentem-se desamparados e podem apresentar diversos sintomas. Assim, aos poucos se convencem da versão que lhes foi implantada, gerando a nítida sensação de que essas lembranças de fato aconteceram. Isso gera contradição de sentimentos e destruição do vínculo paterno-filial. Restando órfão do genitor alienado, acaba o filho se identificando com o genitor patológico, aceitando como verdadeiro tudo que lhe é informado.
O filho é utilizado como instrumento da agressividade, sendo induzido a odiar um dos genitores. Trata-se de verdadeira campanha de desmoralização. A criança é levada a afastar-se de quem ama e que também a ama.
Infelizmente, é difícil a identificação da existência ou não dos episódios denunciados. Complicado reconhecer que se está diante de uma alienação parental e que a denúncia do abuso foi levada a efeito por espírito de vingança, como meio de acabar com o relacionamento do filho com o genitor.
Muitas vezes, nem os psicólogos conseguem identificar que se trata de sentimento de ódio exacerbado, que leva ao desejo de vingança, a ponto de programar o filho para reproduzir falsas denúncias, com o só intuito de afastá-lo do genitor.
Sejam as acusações falsas ou verdadeiras, a criança já é vítima de abuso. Sendo verdadeiras, a vítima sofre as consequências devastadoras que este tipo de abuso proporciona. Sendo falsas, ela é vítima de abuso emocional, que põe em risco o seu sadio desenvolvimento. A criança certamente enfrentará uma crise de lealdade e sentimento de culpa quando, na fase adulta, constata que foi cúmplice de uma grande injustiça.
A Lei 12.318/10 define alienação parental (art. 2.º):
“interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância, para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.”
Ou seja, a lei cria o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima de violência, ao reconhecer a alienação parental como violência contra a criança (Lei 13.431/2017 4º b). Havendo indícios dessa prática, procure advogado especializado para instaurar procedimento autônomo ou incidental, com tramitação prioritária, a fim de preservar o melhor interesse da criança.
Lorena Dayse P. Santos
OAB/SE 6.406
Advogada do Escritório Amadeus & Santos