Entenda a Lei 14.793/2024 (atualização do valor dos imóveis) e por que ela pode ser uma pegadinha fiscal?​

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Entenda a Lei 14.793/2024 (atualização do valor dos imóveis) e por que ela pode ser uma pegadinha fiscal?

Com a promulgação da Lei 14.793/2024, que visa à compensação da desoneração da folha de pagamento e ao ajuste da arrecadação fiscal, empreendedores do mercado imobiliário devem redobrar a atenção.

Apesar das aparentes vantagens da atualização patrimonial proposta pela nova legislação, há uma série de armadilhas fiscais escondidas, que podem impactar negativamente os negócios no longo prazo.

Neste texto vamos abordar as leis, aspectos práticos e como a legislação pode fazer com que a gente pense em um proveito, mas na verdade pode acarretar em prejuízo, sendo necessário um planejamento prévio para tomar a atitude mais cabível ao caso concreto.

  1. Lei 14.793/2024 e a reoneração das folhas de pagamento

A Lei 14.793/2024, sancionada em setembro de 2024, surge como uma tentativa do governo federal de recuperar parte da arrecadação perdida com políticas de desoneração da folha de pagamento, especialmente voltadas a setores estratégicos da economia. Além disso, ela oferece a possibilidade de atualização do valor dos imóveis para fins fiscais, mediante o pagamento de uma alíquota reduzida de 4% sobre a diferença entre o valor atual de mercado e o valor registrado.

O problema, porém, é que essa compensação da desoneração da folha de pagamento recai, de forma indireta, sobre o setor imobiliário, que terá a opção de atualizar os valores dos imóveis de maneira voluntária. O benefício parece claro: regularizar o valor dos ativos imobiliários com uma tributação menor. No entanto, esse mecanismo esconde uma série de implicações que podem, a longo prazo, comprometer a rentabilidade dos negócios, especialmente se não houver uma análise cuidadosa das suas consequências fiscais e patrimoniais.

A nova lei também atua em um contexto onde a pressão por arrecadação aumenta, levando o governo a buscar fontes adicionais de receita. Ao mesmo tempo, esse mecanismo visa oferecer uma oportunidade de ajuste patrimonial que, a princípio, parece favorável.

  1. Objetivos da Lei

O objetivo central da Lei 14.793/2024 é promover a reoneração da folha de pagamento de setores beneficiados por desonerações anteriores, com a criação de uma alternativa para que empresas do setor imobiliário regularizem o valor de seus imóveis. A proposta é simples: empresas ou pessoas físicas que detenham imóveis com valores desatualizados podem realizar a atualização com base no valor de mercado, pagando uma alíquota de 4%.

O intuito da lei é permitir uma adequação patrimonial de forma a ajustar a realidade de mercado dos imóveis, especialmente em um momento onde o setor imobiliário enfrenta oscilações consideráveis.

Contudo, é preciso considerar que a arrecadação fiscal gerada por essa alíquota reduzida representa uma “isca”, pois, ao atualizar o valor patrimonial, o contribuinte assume uma nova base tributável, tanto para Imposto de Renda quanto para outros tributos incidentes.

  1. Impactos da Lei na prática

Na prática, o impacto da Lei 14.793/2024 é ambíguo e pode gerar implicações fiscais importantes. A seguir, apresentamos dois casos práticos para ilustrar a aplicação dessa nova legislação:

Caso 1: Incorporadora com grande estoque de imóveis

Uma incorporadora que possui um vasto estoque de imóveis desvalorizados pode enxergar na atualização patrimonial uma oportunidade de corrigir esses valores para se alinhar ao mercado atual. Ao optar por pagar a alíquota de reduzida, essa empresa pode evitar maiores problemas futuros com a Receita Federal e, ao mesmo tempo, melhorar sua posição patrimonial para novas operações financeiras.

No entanto, o impacto a longo prazo pode ser um aumento significativo da base de cálculo para o IR, já que o valor atualizado servirá como referência para futuras tributações sobre lucros e ganhos de capital.

Caso 2: Pequeno investidor imobiliário Por outro lado, um investidor que detém imóveis para locação pode hesitar em aderir à atualização patrimonial, por receio de que o novo valor impacte negativamente seus ganhos futuros, especialmente em um cenário de aumento nos preços do IPTU e ITBI. Nesse caso, a escolha pode ser não atualizar os valores e aguardar uma eventual venda, correndo o risco de ser surpreendido com tributações mais elevadas caso o valor de mercado dos imóveis continue subindo.

Esses casos exemplificam o dilema enfrentado pelos empresários e investidores do setor: atualizar ou não os valores dos imóveis. A decisão precisa ser tomada com base em uma análise detalhada dos impactos fiscais e financeiros que essa atualização pode trazer.

  1. Pegadinha Fiscal

A Lei 14.793/2024 introduz a possibilidade de atualização do valor dos imóveis com o pagamento de uma alíquota reduzida de 4% para pessoas físicas, o que, à primeira vista, pode ser atraente para proprietários e investidores. No entanto, essa “facilidade” esconde implicações jurídicas e fiscais que podem transformar essa oportunidade em uma armadilha para quem não considerar todas as variáveis envolvidas.

Do ponto de vista jurídico, ao atualizar o valor dos imóveis, o contribuinte formaliza um novo valor patrimonial que passa a servir de base para a apuração de tributos como o Imposto de Renda sobre o ganho de capital (IR), o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) e o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU). Enquanto o cálculo do IR sobre o ganho de capital na venda do imóvel será, de fato, reduzido devido à atualização do valor de mercado, essa mesma atualização aumenta a base de cálculo para o IPTU e ITBI, que são tributos recorrentes.

Na prática, isso significa que o proprietário, ao optar por essa atualização patrimonial, pode enfrentar um aumento na sua carga tributária anual, principalmente em municípios onde o valor do IPTU é diretamente influenciado pela avaliação de mercado dos imóveis. É importante destacar que, no caso do ITBI, que incide sobre a transmissão de bens imóveis, a legislação tributária muitas vezes permite que os municípios ajustem suas alíquotas e bases de cálculo com maior liberdade, o que pode tornar a atualização ainda mais custosa em determinadas situações.

Além disso, a formalização desse novo valor patrimonial implica um efeito jurídico de longo prazo, pois a Receita Federal passa a contar com uma referência sólida para futuras fiscalizações. O contribuinte, ao atualizar o valor dos seus imóveis, cria uma “trilha” documental que poderá ser utilizada para fins de auditoria fiscal, o que inclui a revisão de declarações de IR anteriores e a reavaliação de eventuais ganhos de capital declarados de forma divergente. Esse é um aspecto jurídico que não pode ser negligenciado, pois as operações imobiliárias estarão sob escrutínio fiscal com base nos novos valores.

Outro ponto a ser considerado é o cenário de mercado, de forma que caso o setor imobiliário passe por um processo de desvalorização nos próximos anos, o contribuinte que optou pela atualização patrimonial voluntária ficará preso a um valor elevado para fins de tributação, independentemente da queda no valor de mercado. Isso pode criar uma distorção entre o valor real do imóvel e a base de cálculo tributária, resultando em uma maior onerosidade fiscal para o proprietário.

Juridicamente, essa situação também pode gerar discussões sobre o princípio da capacidade contributiva, uma vez que o contribuinte poderá ser forçado a pagar tributos desproporcionais em relação ao valor de mercado do imóvel no momento da tributação. Essa distorção fiscal pode, eventualmente, ser questionada judicialmente, mas o custo e a complexidade de tais litígios podem tornar essa via pouco prática para a maioria dos empreendedores imobiliários.

Cabe destacar ainda que diante da nova lei, o contribuinte pagaria uma alíquota menor agora, criando uma base fiscal mais alta que impactaria diretamente na cobrança de impostos futuros, porém essa opção de atualização pode ser financeiramente vantajosa apenas depois de alguns anos, quando o mercado imobiliário tiver uma valorização significativa, tornando a diferença entre o valor atualizado e o preço de venda substancialmente menor. Ou seja, a economia no pagamento do Imposto de Renda só compensaria após um período em que o imóvel acumulasse um ganho de capital relevante, o que nem sempre é garantido em um mercado volátil.

Por fim, há que se considerar o risco de a Receita Federal utilizar o valor atualizado como base para futuras interpretações mais rigorosas das regras de apuração de ganho de capital, especialmente em situações onde o contribuinte tenha optado por não atualizar o valor de outros imóveis. Isso pode criar uma inconsistência nos valores declarados ao longo do tempo, gerando um campo fértil para autuações fiscais.

Dessa forma, o que inicialmente parece ser uma oportunidade de regularização fiscal com uma alíquota reduzida pode se transformar em uma armadilha com efeitos colaterais significativos.

Portanto, imprescindível que os empresários do setor imobiliário consultem profissionais jurídicos e fiscais antes de aderir à atualização prevista pela Lei 14.793/2024, de modo a evitar surpresas desagradáveis no futuro e garantir que a decisão seja tomada com plena compreensão dos impactos legais e financeiros.

  1. Conclusão

A Lei 14.793/2024 traz uma aparente oportunidade para o setor imobiliário ao permitir a atualização patrimonial dos imóveis com uma alíquota reduzida de 4% para pessoas físicas e 10% para pessoas jurídicas. Contudo, essa atualização esconde uma série de armadilhas fiscais que podem comprometer os negócios a longo prazo. Para os empreendedores do setor, a recomendação é que essa decisão seja tomada com cautela, sempre considerando os impactos tributários futuros.

O ideal é que os empresários façam uma análise detalhada das suas carteiras de imóveis e consultem especialistas antes de aderir à atualização patrimonial proposta pela Lei 14.793/2024. O que pode parecer uma vantagem fiscal imediata pode, na verdade, se transformar em um grande ônus tributário no futuro, especialmente em um cenário de mercado incerto, como o mercado imobiliário.

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Andress Amadeus P. Santos
Especialista em Direito Imobiliario, Cartorial, Notarial e Registral pela UNISC/RS Mestrando em Direito – IDP/DF Management pela Ohio Univeristy
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